domingo, 26 de julho de 2015

CinderElla





E novamente, inesperadamente, ela o encontrou, num repente, olharam-se como da primeira vez. Riu-se do acaso, pensara naqueles olhos por toda a semana, e agora os tinha ali. “Quando se quer muito algo o universo conspira a favor”, ela lembrou, e logo se imaginou sendo seguida por ele, imaginou-se sendo abordada, ensaiou o que diria. Mas ao descer do ônibus, pôs os pés no chão e percebeu que não é era Cinderela, não havia festa, nem fada.

sábado, 25 de julho de 2015

Desabafo



Ela sentia que queria chorar, evitava olha-lo nos olhos, sabia que ele sabia que havia algo estranho. O cansaço declarado nas palavras, no rosto, e no corpo que pedia insistentemente o conforto da inércia. Ele sabia. Não o quê, mas seus olhos acusavam a vontade. Chegou a dizer o que há tempos já havia percebido, chegou a perguntar o que a afligia. Ela desconversou, olhou de lado, e sem o encarar, engoliu o choro, forçou o riso e safou-se de um desabafo. Ela não sabia ser vulnerável.

Remorço

22 horas, ela chega em casa, esquenta a janta, e se senta no sofá.  Ele se levanta, senta-se ao seu lado e diz que ficou preocupado com a demora, quer saber como foi seu dia. Cansada ela não lhe dá atenção. Ocupa-se com a TV, a comida, ao seu lado ele... Sozinho.

Carona

A olhou nos olhos e disse “oi”. Não colocou os óculos escuros, viajou vendo seus olhos no retrovisor. Não tocou sertanejo ou axé,  pós em alto e bom som aquelas baladinhas do tempo em que se dançava junto, brega, porém fofo. A ouviu quando falou. Acelerou ao perceber que curtia o vento nos cabelos. Escolheu o caminho mais longo e, ao se despedir, chegou perto, perto o suficiente para lhe encabular. Sorriu, riso raro e lindo. Tudo assim, tão pequeno, mas tão grande.

Olhos de tormenta

Professora em ajustamento funcional, que assim como tantos não suportou a pressão de uma sala de aula, e precisou ser afastada da docência. O diagnóstico: depressão, o prognóstico: nenhum contato com aluno. Mas, como a superfície não mostra a profundidade do lago, a tristeza que a acometeu adveio de uma separação, ou, mais apropriadamente, um abandono. A decisão do outro de não mais compartilhar a vida com ela e, pior, compartilhar-se com outra, ruiu o alicerce sobre o qual se sustentava: viver para ser esposa. Sem prumo, viu-se a frente de uma vida para a qual não se preparou, não previu. Divorciar-se não é plano de quem se casa. Não de verdade. A base de remédios, hoje, fala sozinha, quase que resmungando, ainda sorri, brinca com a própria sorte, mas tem uma sombra no olhar, como nuvem em dias de tempestade.

"Entre tantos outros. Que sorte a nossa heim?"

Sábado a noite... Show de quem mesmo? Traz uma cerveja que fica bom! Dois para lá, batcun, tatata...  Ao olhar para o lado, os olhos mais lindos da noite encontram os seus, surpresos hesitam, mas não resistem e voltam a se encontrar. Encontram-se a noite toda. Desejo confesso. Mas a descrição dada àqueles olhos é o equivalente a “não é para seu bico”. Fim de noite, a frustração, a vontade de ter um “bico” compatível, a despedida de canto de olho, e um querer que não passa.

sábado, 18 de julho de 2015

“num desses encontros casuais...”

Sentiu que já não era necessária. Sua ausência já não era sentida, sua presença tão pouco requisitada. Lançou-se um desafio: foi saber o quanto demoraria para ser procurada...Demorou muito. Cansada da espera, ligou, ligou, ligou, do outro lado o som distante dos toques repetidos até a caixa postal. Desconfiou, algo não ia bem, até que um abraço frio num encontro casual fez da desconfiança uma certeza. Nem mesmo sabia o porquê. Não tivera o beneficio da dúvida... De longe, questionou, a resposta veio resignada, em tom de adeus... A tristeza levou à uma nova procura, e o tom de despedida se tornou  vitimista e acusativo. "Davi venceu Golias". O cansaço diante de algo tão pequeno, fez surgir o silêncio... Restou-lhe a culpa e a tristeza... Uma fraternidade “apagada” por uma distância que, na verdade, nunca existiu.